Gestão Proativa do Burnout: a solução que vem do espaço!

Há anos, as ações para redução e gerenciamento do estresse no ambiente de trabalho estão no topo dos programas de qualidade de vida das empresas, em todo mundo. Porém, apesar dos investimentos realizados, esses esforços não produzem os resultados práticos desejados. Como explicar que gestores altamente capacitados, não conseguem reverter esse quadro?

Mesmo antes do início da pandemia, em 2018, dados coletados pela associada brasileira da International Stress Management Association (ISMA-BR), indicavam que 30% dos então 110 milhões de trabalhadores no Brasil já sofriam da síndrome do esgotamento profissional, ou Síndrome de Burnout, impulsionada pela competitividade globalizada e demais estressores crônicos inerentes a má gestão do estresse organizacional.

Nessa ocasião, Ana Maria Rossi, presidente da ISMA-BR, ressaltava que além dos prejuízos à saúde do trabalhador, o burnout acarretava um custo de 80 bilhões para as empresas brasileiras, representando cerca de 3,5% do PIB (Produto Interno Bruto) nacional. No ranking mundial de prevalência da síndrome de burnout, conforme os dados de 2018, o Brasil ocupava a segunda posição, ganhando dos chineses e americanos, e perdendo apenas para os japoneses, que apresentaram 70% da população atingida.

Com os avanços tecnológicos e a possibilidade de trabalhar a qualquer hora e em qualquer lugar, eliminamos progressivamente a ideia da busca pelo equilíbrio entre a vida profissional e a vida pessoal, criando a necessidade e o desafio de administrar a integração trabalho-vida, 24 horas, sete dias na semana, 365 dias ao ano.

Não é de se estranhar, que o relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS) de dezembro de 2019 relaciona, entre as dez principais causas de morte e incapacidade em todo mundo, sete doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), todas correlacionadas com os níveis de estresse e o estilo de vida.

Com a pandemia de COVID-19, observamos um aumento exponencial dos transtornos mentais, devido ao isolamento social e a fusão entre a vida familiar e profissional na modalidade “home office” ou escritório em casa. A solução de trabalhar em casa, além de modificar totalmente o ambiente de trabalho, passou a exigir muito mais disciplina, organização e responsabilidade. Porém, quando isso ocorre no mesmo ambiente onde filhos e demais membros da família estão convivendo de forma “confinada”, os níveis de estresse crônico se elevam, gerando um quadro caótico com forte impacto na saúde de todos.

Segundo o relatório do Pew Research Center de março de 2021, com o avanço da pandemia, as preocupações com a saúde pessoal e a segurança financeira produziram níveis mais altos de sofrimento psicológico, o qual, conforme a revisão sistemática e meta-análise realizada por BARRY et.al (2020), resulta em vários desfechos adversos à saúde, como exaustão emocional, redução da resposta imune, aumento das DCNT, e mortalidade.

O resumo científico divulgado pela OMS em 2 de março de 2022, destaca que no primeiro ano da pandemia de Covid-19, a prevalência global de ansiedade e depressão aumentou em 25%, apontando o isolamento social, as dificuldades para a realização do trabalho, a restrição do apoio de entes queridos e da comunidade, agravados pelo medo de infecção, com possibilidade real de morte, para si mesmo e de entes queridos, luto e incertezas financeiras.

Em contrapartida, para alguns, trabalhar em casa com uma tecnologia on-line aprimorada e impulsionada pelo próprio cenário pandêmico, permitiu otimizar o tempo e incluir hábitos saudáveis em suas agendas, como atividade física, alimentação adequada, além de eliminar estressores metropolitanos crônicos, como o deslocamento casa-trabalho-casa, muitas vezes longo e inseguro. O ganho de qualidade de vida expressivo gerou um fenômeno interessante e um problema para as empresas: pedidos de demissão em massa de colaboradores altamente capacitados.

No início de 2022, o retorno ao modelo presencial e/ou híbrido, motivado pelo abrandamento da pandemia, coincidiu com a inclusão da síndrome de Burnout na 11ª Revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-11), sendo considera pela Organização Mundial de Saúde como um “fenômeno exclusivo do contexto ocupacional resultante do estresse crônico no local de trabalho que não foi gerenciado com sucesso”, ressaltando, porém, de “não se tratar de uma condição médica”.

Estudos demonstram, que estabelecer um ambiente corporativo seguro, promovendo o bem-estar pessoal e interpessoal dos colaboradores, é decisivo para garantir a tão almejada produtividade (PORGES, 2021; WEKENBORG et.al, 2022). Porém, por mais que isso nos pareça óbvio, as estatísticas continuam a demonstrar um crescente adoecimento dos colaboradores, redução na produtividade por presenteísmo e afastamento por burnout, gerando altas taxas de rotatividade e um grande prejuízo para as organizações. Algo está muito errado. Necessitamos urgentemente de uma solução.

Por tanto, agravada pela pandemia, a questão que era prioritária, tornou-se emergencial: como reduzir os níveis de estresse, melhorar o desempenho e promover qualidade de vida, saúde e bem-estar no ambiente corporativo, com eficácia? A solução, por incrível que pareça, não é uma novidade e tem a sua origem em 1958, no início da corrida espacial!

A máxima “Se você não pode medir, não pode gerenciar”, de Peter Drucker, ganhou ampla aplicação no contexto organizacional, promovendo a busca por fatores mensuráveis que pudessem auxiliar os gestores, tanto no monitoramento dos resultados, como na tomada de decisões inteligentes. Assim, os indicadores-chaves de desempenho ou KPIs, sigla em inglês, se tornaram imprescindíveis no monitoramento das métricas relevantes para o sucesso de cada negócio.

Indiscutivelmente, a melhora da produtividade, individual e das equipes, será sempre um dos principais objetivos em qualquer negócio, sendo diretamente impactado, como destacamos anteriormente, pelo bem-estar individual e coletivo. Porém, o que fica claro para nós, é que não se consegue produtividade, engajamento e comprometimento em ambientes que promovam o esgotamento!

Dessa forma, no lugar de medir apenas a produtividade, a solução é adotar métricas que retratem os níveis de bem-estar individual e coletivo, com base em parâmetros extraídos dos indicadores psicofisiológicos dos colaboradores. Os achados científicos apontam a Variabilidade da Frequência Cardíaca (VFC) como o mais eficaz biomarcador não invasivo e com baixo custo para essa tarefa (PORGES, 1995; LENNARTSSON, 2016; THAYER et. al, 2012).

Historicamente, as pesquisas com os parâmetros da VFC foram iniciadas em 1958, por dois cientistas russos, V.V. Parin e R.М. Baevsky, na busca de uma métrica para avaliação da regulação autonômica e monitoramento dos estados funcionais do organismo humano em voos espaciais, sendo utilizada desde a primeira missão, com Yuriy Gagarin em 1961 (BAEVSKY, 2015).

A metodologia, posteriormente incluída no programa da estação espacial Mir (1989), possibilitou o monitoramento à distância, da saúde e da prontidão para o trabalho das equipes de cosmonautas, atuando em situações críticas de confinamento com altos níveis de estresse, dando origem à teoria do diagnóstico pré-nosológico, com ampla utilidade na saúde pública (BAEVSKY e BERSENEVA, 2017). Hoje, todas as principais agências espaciais do mundo, incluindo a NASA, utilizam a VFC como principal indicador de prontidão para o trabalho, capacidade cognitiva e saúde dos astronautas (BAEVSKY, 1997 e 1998; BREUS et. al, 2012; PUGACHEV et.al, 2014).

Com os atuais avanços da microinformática, os parâmetros da VFC podem ser coletados por diversos vestíveis, como anéis, pulseiras, relógios, e câmeras dos smartphones, permitindo de forma prática, econômica e não invasiva, aferir a capacidade de autorregulação do organismo através da avaliação funcional do Sistema Nervoso Autônomo (SNA), mensurando o equilíbrio entre a capacidade de enfrentamento (ramo Simpático do SNA) e de recuperação (ramo Parassimpático do SNA) do organismo. Os dados gerados, além de expressar o tônus autonômico individual, permitem mapear anonimamente, os setores da organização pelos níveis de estresse, indicando as tendências e possibilidades de esgotamento, com muita antecedência (LENNARTSSON et. al, 2016; PARK et. al, 2007; THOMAS et. al, 2019; PIHLAJA et. al, 2022; SHI et. al, 2021; WEKENBORG et.al, 2022).

Em paralelo com o monitoramento e o mapeamento interno do impacto do estresse nos setores das organizações, os aplicativos que coletam os dados individuais, em geral incorporam a funcionalidade de treinamento de respiração guiada, denominada Biofeedback Arritmia Sinusal Respiratória (BFK ASR). O treino diário de BFK ASR é cientificamente comprovado como uma prática que melhora a capacidade de autorregulação orgânica, promovendo o aumento do tônus Vagal, da resiliência e da capacidade de enfrentamento ao estresse.  O BFK ASR possui como aspecto principal a frequência respiratória. A modificação do ritmo respiratório em sincronia com os batimentos cardíacos influenciam a flutuação da arritmia sinusal respiratória (ASR) e modulam a variabilidade da frequência cardíaca (YASUMA; HAYANO, 2004). As pesquisas demonstram que a utilização do BFK VFC como um treinamento diário, que pode contribuir para a acentuação da ASR, aumento da VFC, diminuição da atividade simpática e dos sintomas de estresse (NASHIRO et.al, 2022). 

Em resumo, com a implementação de um programa de gestão do estresse com base na VFC, atuamos tanto individualmente, pelo monitoramento em tempo real do estado funcional do SNA de cada colaborador, como no âmbito macro da organização, permitindo executar de forma eficaz e proativa, ações que melhorem as condições de trabalho, com impacto positivo na saúde, no bem-estar e na produtividade dos colaboradores.

Referências:

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